11/04/2017 21h47 - Atualizado 24/05/2017 10h36

Palestra- A Mulher e o poder público: participação feminina nos espaços decisionais

Por Terezinha
para IARGS
A Desembargadora Elaine Harzheim Macedo foi a palestrante convidada do Grupo de Estudos de Direito de Família do IARGS, hoje, dia 11/04, para falar sobre o tema “A Mulher e o poder público: participação feminina nos espaços decisionais”. A anfitriã do encontro foi a diretora do instituto Liane Bestetti.
A palestra, exibida em PowerPoint, foi dividida em três planos sobre a participação da mulher junto aos poderes públicos: Lei Regulamentadora da cota feminina nas eleições proporcionais; Lei do Poder Executivo e Senado em eleições majoritárias; e dados representativos da exclusão da mulher em cargos públicos.
De acordo com a Desembargadora, primeira mulher na história a assumir o cargo de presidente do TRE/RS, em 2013, ainda é um novo horizonte resgatar a mulher como cidadã e agente de transformação da sociedade. Relatou que, embora representem mais da metade da população brasileira (52% são mulheres e 48% são homens) e do eleitorado nacional (53% do eleitorado nacional são mulheres), as brasileiras ainda têm um grande desafio para se consolidar na política. 
Segundo a Dra Elaine, o Brasil amarga uma das piores colocações no ranking mundial de presença feminina no Parlamento, apesar de 44,2% de filiados em partidos políticos serem mulheres. Ressaltou que a Constituição Federal embasa seu ponto de vista no art. 1º, e a igualdade, consagrada no art. 5º, inciso I: homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações.
Em estudo recente realizado pela União Interparlamentar (UIP) ratificou que o Brasil ocupa o ranking de 154º em um total de 193 países avaliados, encontrando-se em desvantagem inclusive de países árabes, nos quais os direitos das mulheres ainda são muito questionados. “A título de exemplo, a Etiópia, o Afeganistão, o Cazaquistão e a Arábia Saudita contam com índices mais representativos”, apontou.
Citando exemplos positivos, Elaine mencionou que a Noruega adotou o sistema de cotas conta com 40% de participação feminina nos parlamentos, e a França, seguindo o mesmo caminho, conta com quase 30% de mulheres nas vagas legislativas. Na América do Sul, apontou, o maior exemplo fica por conta da Bolívia e da Argentina, com índices que ficam entre 50 e 40%. “Todos, sem exceção, adotaram o regime de cotas de gênero para melhor a participação feminina na política”, declarou.
Elaine relatou que, na legislação eleitoral, somente em 1995, na Lei dos Partidos Políticos, surgiu a primeira regra tutelando a participação das mulheres no processo eleitoral, “ainda com conteúdo muito efêmero”, recomendando a participação feminina. 
Todavia, disse que coube à Lei das Eleições (nº 9.504/97) implementar a inclusão das mulheres no processo eletivo, especialmente após a atualização desse dispositivo pela reforma eleitoral de 2009, quando se passou a exigir a presença feminina nas candidaturas do pleito proporcional, disposição essa ratificada pela Lei nº 13.165/2015, na última minirreforma eleitoral. 
A desembargadora lembrou que a história da mulher nas eleições para vagas nos parlamentos e sua consequente evolução foi muito penosa e lenta. Frisou que a primeira Constituição republicana, 1891, estabelecia que somente seriam eleitores os cidadãos maiores de 21 anos que se alistassem na forma da lei, não incluindo as mulheres. 
Contudo, informou que, em 1927, Celina Guimarães Viana, do Rio Grande do Norte, conhecida como a “Dama do Voto”, postulou e conquistou na Justiça seu título eleitoral, participando das eleições no ano seguinte. “Este estado acabou se tornando pioneiro no cenário brasileiro para que as mulheres entrassem no processo eleitoral”, enfatizou, justificando que, nas eleições de 1928, o Partido Republicano local lançou a primeira mulher à candidatura da Prefeitura de Lajes, Alzira Soriano, eleita com 60% dos votos, tornando-se a primeira prefeita na América do Sul.
Seguindo o exemplo, expôs que a mineira Mietta Santiago, advogada e poetisa, por meio de uma ação judicial, conquistou o direito de votar pelo Poder Judiciário, situação que se repetiu em outras iniciativas femininas. Em 1934, em Santa Catarina, foi eleita a primeira mulher negra no cargo de deputada estadual, Antonieta de Barros. 
Referiu que, lamentavelmente, o Estado do Rio Grande do Sul, apenas em 1948, elegeu a primeira mulher vereadora, em Porto Alegre: Julieta Bastitioli, eleita como suplente de Eloi Martins, pelo Partido Social Progressista. 
Nos dias atuais, disse, mais de 40% dos filiados a partidos políticos são mulheres. “Esse fato, por si só, afasta o argumento não científico de que mulheres não gostam ou não se interessam por política”, argumentou. 
Quanto aos resultados das últimas eleições gerais (2014) e municipais (2016), indicou que os resultados máximos vão de 11 a 13% dos eleitos. Em relação à Câmara de Deputados Federais, os índices são ainda mais baixos, não alcançando 10% de participação feminina.
Para a eleição do cargo de Senador pelo sistema eleitoral majoritário, indicou que não há qualquer legislação que regule a participação feminina, embora em outros países essa omissão não aconteça. Dos 81 senadores, nas eleições de 2014, foram eleitas cinco mulheres, correspondendo ao percentual de 6,17%.
A exemplo do Senado, disse que não há qualquer lei que regulamente a participação das mulheres nas eleições majoritárias aos cargos do Poder Executivo. No pleito de 2016, apenas uma mulher governadora foi eleita, baixando, inclusive o índice em relação aos anos anteriores. Para o cargo de prefeito, os percentuais ficam em torno de 12% ou menos.
A partir desses dados, concluiu que, desde 1997, quando foi elaborado o primeiro texto de lei de cotas de gênero, nunca foram ultrapassados os limites que variam de 7, 8 a 10, 11, 12%, muitas vezes com zero representação feminina. Na oportunidade, divulgou dados veiculados recentemente pela BuzzFeed, indicando que 147 municípios no Estado de São Paulo não contam com prefeita ou vereadora, logo, mulher alguma foi eleita em 2016 em quase 23% dos municípios paulistanos.
Quanto à Presidência da República, ao longo de mais de 100 anos de República, foi eleita apenas uma mulher, Dilma Roussef. 
Já no Poder Judiciário, explanou que o primeiro movimento da presença das mulheres aconteceu nos anos 70/80, ainda que em índices baixíssimos. Citou como exemplo o caso da primeira juíza mulher, Auri Moura Costa, nomeada em 1939, no estado do Ceará. Constam dos anais do TJCE que Auri somente foi nomeada depois de confundida com um homem em razão de seu nome. Referiu, ainda, a magistrada Luislinda Dias de Valois Santos, baiana, neta de escravo, como a primeira juíza negra do Brasil, em 1942. 
Atualmente, de um total de 140 desembargadores, o TJRS conta em seus quadros com 40 mulheres, não atingindo 1/3 (46). Quanto à administração, lembrou que a Desembargadora Liselena Robles Ribeiro foi a primeira a integrar a direção do tribunal quando, na gestão de 2010/2012, ocupou o cargo de 3ª vice-presidente e, na gestão atual, 2016/2018, a Desembargadora Isabel Maria de Azevedo Souza integra a administração como 2ª vice-presidente e, a Desembargadora Iris Helena Nogueira, conduz a Corregedoria-Geral da Justiça. “São apenas duas gestões com a presença feminina, representada por três mulheres nos cargos de administração ao longo dos últimos seis anos”, afirmou.
No TRT da 4ª Região, registrou que a Justiça do Trabalho foi mais receptiva no que diz com o ingresso de magistradas mulheres, alcançando um número de participação exemplar se comparado com outras instituições, estaduais ou federais do Poder Judiciário.
Hoje, disse, o TRT da 4ª Região é composto por 48 cargos de Desembargadores. “Considerando que um está vago, remanescem 23 mulheres e 24 homens, uma proporção adequada por atender cerca de 50% dos espaços decisionais na Justiça do Trabalho do Rio Grande do Sul, junto ao seu órgão de cúpula”, acrescentou.
Salientou que na administração, que é composta por duas mulheres e dois homens, está na presidência a Desembargadora Beatriz Renck e exerce a Corregedoria-Regional a Desembargadora Maria da Graça Ribeiro. 
Na Justiça Federal, em levantamento feito em março de 2016, constatou-se que apenas 26,2% dos magistrados federais são mulheres. “O TRF da 5ª Região, por exemplo, não conta com nenhuma mulher no seu quadro de 15 desembargadores federais”, evidenciou.
Já no Superior Tribunal de Justiça, informou, dos 33 ministros que o compõem, apenas seis são mulheres, correspondendo a 15% ou 1/6 de sua composição, índice mais elevado que o STJ já alcançou. Anteriormente, especificou, só duas ministras conquistaram este cargo: Eliana Calmon, que se aposentou, e Denise Martin Arruda, que faleceu. “Ou seja, ao longo de 29 anos, oito mulheres passaram por seus quadros”, observou.
No Supremo Tribunal Federal, nos dias atuais, de um total de 11 ministros, citou que duas são mulheres, representando 15% de sua composição. “Em mais de 100 anos de existência, três mulheres integram o nosso tribunal constitucional, sendo a primeira na década passada e, no presente, as Ministras Carmem Lúcia e Rosa Weber”, disse.
Em recente levantamento realizado nos 27 Tribunais Estaduais e Distrital, foi constatado que há 20% de mulheres desembargadoras. “Isso significa dizer que em um universo de mais ou menos 1.500 cargos de desembargadores, 298 são ocupados por mulheres”, salientou.
Na avaliação da Desembargadora Elaine Macedo, tais dados reproduzem a flagrante exclusão da mulher nos espaços decisionais judiciais, cuja presença vai do zero a, no máximo, 26 ou 27%.
De qualquer modo, verificou que os números de mulheres hoje na magistratura são mais favoráveis dos que os exibidos pelo Poder Legislativo (cujos percentuais alcançam no máximo 11; 12 ou 13%) e, o Poder Executivo, quase inexistente (o que também vale para o chamado 2º escalão: no Governo Temer, de 28 cargos com status ministerial, apenas duas mulheres integram a equipe).
No que diz respeito ao empoderamento das mulheres no poder público, Elaine se referiu a palavra dita pela primeira atriz negra (vencedora do Oscar 2017 como atriz coadjuvante), Viola Davis, ao conquistar o Emmy em 2015: oportunidade. “Às mulheres são negadas oportunidades iguais às que são ofertadas ao homem. E a falta de oportunidades leva a um segundo obstáculo: visibilidade”, ressaltou.
De qualquer forma, disse, no que se refere à participação feminina nos espaços públicos de decisão, embora ainda modesta a evolução da mulher nos tribunais do país, o crescimento nas últimas duas/três décadas é sensível, ao contrário do que acontece no processo eleitoral.
A Desembargadora advertiu, contudo, a existência de candidaturas laranjas, ou seja, candidaturas apenas que se prestam para sustentar candidatos homens, fraudando as eleições.
Como proposta de solução à tímida participação feminina em pleitos, Elaine Macedo sugere seis caminhos. Primeiro, a mulher deve se conscientizar que ela não é só o objeto do problema, é também sujeito de transformação. “Isso demanda uma grande movimentação da sociedade civil. Tomar partido é exercício de cidadania”, acentuou.
Segundo, entende que é preciso trazer os homens para esse debate. Informou que pesquisa do IBOPE e da ONU, divulgada no dia 14 de março deste ano, apontou que 75% dos brasileiros consideram importante a adoção pelos gestores e legisladores de políticas de promoção de igualdade entre mulheres e homens. 
Terceiro, para complementar, preveniu que é preciso que as mulheres que venceram os obstáculos e que alcançaram os espaços decisionais tenham dupla responsabilidade: por si e pelas próximas e, quarto, que não se intimidem ao assumir cargos eletivos ou de nomeação. 
No quinto aspecto, aconselha o gerenciamento do tempo: “Na maioria das vezes, a mulher tem a chamada dupla jornada, cuidando de seus empregos e administrando a casa e a família, e tal gerenciamento implica também trazer à parceria toda a família”.
No sexto e último aspecto, chama a atenção sobre a educação. “Temos consciência de que a inclusão da mulher nos espaços decisionais é um produto negativo da cultura, assim como foi no passado com a escravidão. O que deve ser modificado é o paradigma cultural no qual a mulher é refém do tanque e do fogão, como se fosse um ser hipossuficiente. E isso passa, necessariamente, pela educação, que deve começar já na escola infantil. Temos que investir nas novas gerações”, concluiu.
Terezinha Tarcitano
Assessora de Imprensa

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