08/05/2018 19h07 - Atualizado 08/05/2018 19h07

Palestra- O que as palavras revelam e o que as palavras ocultam

Por Terezinha
para IARGS
“O que as palavras revelam e o que as palavras ocultam” foi o tema escolhido pelo psiquiatra e psicanalista Marco Aurélio Crespo Albuquerque no Grupo de Estudos de Direito de Família do IARGS, hoje, dia 08/05, no quarto andar do instituto, sendo recepcionado pela presidente Sulamita Santos Cabral.
Ele abordou psicanaliticamente e filosoficamente o uso das palavras como é feito hoje em dia, usadas em narrativas – “nem sempre verdadeiras nas lutas sociais pelo poder” – que se travam em todos os campos, jornalismo, redes sociais etc. Explicando o real significado da etimologia da palavra, conversou sobre o tema e fez uma análise de como isso impacta na vida pessoal e profissional. Ao final, promoveu um debate com todos os participantes do grupo.
Fazendo uma retórica no início da preleção, referiu um trecho da Bíblia: “E no princípio havia o verbo.” Parafraseando, disse: “E no início havia a Etimologia”:, ou seja, chegar ao verdadeiro significado das palavras a partir de sua origem. Todavia, advertiu que, modernamente, na busca de uma compreensão mais pragmática das palavras, muitos significados foram alterados.
Lembrou que em uma de suas frases mais famosas, Carlos Drummond de Andrade anunciava, em “O lutador”, que lutar com palavras é a luta mais vã. No entendimento do psicanalista, esta luta refere-se ao significado mais aparente e os significados mais profundos, sejam eles atribuídos contra nós mesmos (como numa difamação) ou ao mundo externo a nós (desfazer um conceito usado de forma equivocada).
Na evolução da humanidade citou algumas eras históricas, começando pela Pré-história, chegando até a Idade Contemporânea. “Dentro desta vivemos agora uma era peculiar, que se aperfeiçoou com o passar do tempo, com o surgimento da linguagem oral e escrita, mas que atingiu seu ápice com o surgimento internet e das redes sociais: eu a chamo de Era das Narrativas”, explicou.
Na avaliação do psicanalista, a língua falada é uma entidade viva, em constante transformação, de vocábulos e de sentidos, como, por exemplo, nos neologismos.
“O neologismo é produto de um processo de criação lexical denominado neologia. Esta pode ser classificada como neologia de sentido e de forma. A primeira consiste no emprego de um significante já existente na língua, ao qual seja dado um significado que não possuía, enquanto a segunda, na criação de significantes novos”, acentuou.
Como exemplo de neologismo de forma, citou o personagem clássico de Odorico Paraguassu (ator Paulo Gracindo), em 1973. Atualmente, referiu, a Era das Narrativas “usa e abusa” dos neologismos de sentido, atribuindo novos significados a palavras já existentes. Dr Marco Aurélio destacou que as palavras existem para expressar ideias: “Se há uma luta de ideias, então, suas armas, as palavras, são parte integrante do arsenal a ser usado em combate”, afirmou, alertando, contudo, que há, também, uma guerra de palavras, onde a entrada, a modificação ou a supressão de algumas delas no campo da luta pode representar vitória ou derrota de uma determinada ideia, avanço ou retrocesso na tomada do poder por um dos lados em luta.
Em relação às chamadas “fake news” (notícias falsas), citou as palavras do professor Cláudio Moreno: “Essas notícias falsas parecem bem verdadeiras porque vêm confirmar aquilo que previamente já pensávamos ou sentíamos sobre um tema. Damos valor às narrativas que reforçam nossas certezas e olhamos com desconfiança qualquer versão que as contrarie.” Em outras palavras, afirmou, cada um acredita naquilo que quer acreditar, e pouco questiona o restante.
Como exemplo, citou o caso da massificação do uso da palavra “golpe” nos últimos tempos em relação ao impeachment da Presidente Dilma. Para tanto, referiu a tradução literal pelo Dicionário de Política de Norberto Bobbio: “Na grande maioria dos casos, o Golpe de Estado moderno consiste em apoderar-se, por parte de um grupo de militares ou das forças armadas em seu conjunto, dos órgãos e das atribuições do poder político, mediante uma ação repentina, que tenha certa margem de surpresa e reduza, de maneira geral, a violência intrínseca do ato com o mínimo emprego possível de violência física.”. E interrogou: “Mas quem teria o interesse de consultar um dicionário antes de empregar a palavra que deseja utilizar? O sentido não interessa mais, apenas o que cada um deseja que faça sentido. Retirando-se o complemento nominal de Estado, fica caracterizado o uso oportunista da palavra golpe fora de seu verdadeiro sentido”.
No entanto, disse, o uso intimidador da narrativa que houve um “golpe”, visa a pôr na defensiva e tendo que se justificar perante a história todos aqueles que, porventura, não acreditarem que houve o golpe de estado. “Caso não acredite que houve um golpe de estado, a pessoa deixa de ser alguém que pensa diferente e entra na categoria inimigo ou, pior ainda, fascista, acusação, comum hoje em dia nas redes sociais”, constatou.
Aliás, ressaltou que fascista, que antes indicava o seguidor de um regime político bem específico (autoritário com concentração total de poder no chefe de Estado), agora se aplica a toda e qualquer pessoa que combata as ideias ditas de esquerda, as que se auto intitulam progressistas. “Assim, fascista perde completamente seu sentido original e passa a ser o antônimo de progressista”.
Concluindo, citou o final da poesia de Carlos Drumond de Andrade referida no início: “O ciclo do dia ora se conclui e o inútil duelo jamais se resolve”.
Terezinha Tarcitano
Assessora de Imprensa

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